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Para melhor enquadramento do problema convém referir que as constelações são um produto da imaginação humana e ao longo dos tempos, em sucessivas ocasiões desde a pré-história, mais constelações foram acrescentadas. Por exemplo, o Touro (conjunto de estrelas associado a este animal), como refere um documento da IAU-União Astronómica Internacional ( http://www.iau.org/public/themes/constellations/ ), já era conhecido pelo Homem de Cro-Magnon (há cerca de 30 000 anos). O Escorpião e o Leão já tinham sido identificados como tal por volta de 4000 anos a.C., na Mesopotâmia (agora Iraque). Houve sucessivos acréscimos de constelações na idade média e os Descobrimentos também revelaram novos céus e a necessidade de aí sistematizar mais constelações.

A última vez que se acrescentaram constelações foi pela mão do astrónomo francês Nicolas Louis de Lacaille (1713-1762), que entre 1750 e 1754 idealizou 14 novas constelações, essencialmente com nomes de instrumentos cientificos e artísticos (por exemplo: Microscópio, Retículo, Telescópio, Buril, Cavalete do Escultor (agora apenas Escultor),  Compasso, Bússola).

A actual sistematização das constelações, definindo quais delas são internacionalmente aceites e quais os limites ou fronteiras de cada uma delas, foi o objecto de trabalho do astrónomo belga Eugène Delporte, que a concluiu na sua obra "La Délimitation Scientifique des Constellations" (1930) (*). Tal obra sistematizou as constelações, fixando em 88 as constelações internacionalmente aceites pela União Astronómica Internacional (IAU), surgiu na sequência da necessidade de uma ampla sistematização do céu, foi objecto de diversas reuniões da IAU desde 1925.

Sobre a sistematização do céu veja-se o link http://doi.org/10.5281/zenodo.1188883

É pouco provável que venha a haver mudanças nos nomes das constelações. Digamos que muito dificilmente haveria consenso nessa matéria. Para mais a sistematização actual, em que os nomes lendários se mantiveram apenas por tradição, tem dado bons resultados. E a tradição levou até a que as novas luas descobertas no Sistema Solar continuassem a ter nomes de divindades gregas e romanas, dando continuidade às tradições anteriores.

Devido à precessão dos equinócios e à consequente mudança (muito lenta) de posição dos pólos celestes e do equador celeste em relação às estrelas, resulta que as fronteiras das constelações foram definidas como arcos de declinação constante e de ascensão recta constante em relação à época 1875.0 .

Com a passagem do tempo, os pólos clestes e o equador celeste já não passam pelas posições de 1875, pelo que, por exemplo, os arcos de declinação constante de 1875 não são já de declinação constante em relação a (por exemplo) 2013. Por outro lado os movimentos próprios das estrelas fazem com que de vez em quando algumas delas (as que estão próximas de fronteiras interconstelações) passem de um lado para o outro de uma fronteira entre constelações, mudando assim de constelação.

O mais provável é que se redefinam (com maior rigor) as fronteiras das constelações, mas não é previsível que se vá além disso: aprimorar o que está e não reformular quebrando uma tradição ainda actual.

A propósito de reformulações, e porque a Igreja Católica tinha muita força no século XVII, o astrónomo e advogado alemão Julius Schiller publicou em 1627 o seu "Coellum Stellatum Christianum", onde substituiu as figuras pagãs das constelações (que ainda hoje conhecemos) por figuras cristãs (**). Tudo isto, para cristianizar o céu. Por exemplo, a Cassiopeia passou a ser Maria Madalena, as 12 constelações do (então) Zodíaco foram substituídas pelos 12 apóstolos e até Orionte passou a ser São José (***). Curiosamente, a antiga constelação do Navio (Argo Navis) foi substituída pela Arca de Noé! O hemisfério celeste norte foi ocupado por figuras do Antigo Testamento e o hemisfério celeste sul foi preenchido com figuras do Novo Testamento, sendo erradicadas as constelações tradicionais. Obviamente a ideia não pegou entre os astrónomos e tudo ficou como antes.

Isto deve ser uma ideia de uma minoria de interessados, que não irá avante, pois não há vantagem prática e só iria criar problemas e inconvenientes desnecessários. Além de romper com uma vasta riqueza histórica e documental. Não colherá consenso. Nâo há na página oficial da IAU  (http://www.iau.org/ ) nada que indique essa reformulação.

_____________

(*)- http://www.southastrodel.com/Page207.htm

e também http://pbarbier.com/constellations/boundaries.html

(**) -Por curiosidade vejam aqui o céu (temporariamente) cristianizado: 

http://www.atlascoelestis.com/epi%20schiller%20cellario.htm

E também uma versão posterior, de 1661; Atlas coelestis seu armonia macrocosmica del 1661

(***) Podemos ver aqui Orionte (Orion) trocado por São José: http://www.lindahall.org/services/digital/ebooks/schiller/bigpix/061103b.jpg

(clique na imagem para ver em tamanho maior). Este mapa está representado na chamada "visão divina" (a esfera celeste vista de fora, só acessível a Deus, dizia-se), pelo que o mapa se apresenta do avesso em relação ao que vemos no céu: o oeste celeste fica para a esquerda do mapa e o este celeste fica para a direita.

___________________

Pode ver-se alguma informação sobre as sucessivas "ondas da sistematização do céu" nos links seguintes:

http://www.platanoeditora.pt/index.php?q=C/BOOKSSHOW/18 (Capítulo 5 e Capítulo 8).
http://www.platanoeditora.pt/files/271/964.pdf

http://www.platanoeditora.pt/files/271/967.pdf

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